Praticamente todos os dias, passo pela calçada da Academia Brasileira de Letras, no Centro do Rio de Janeiro. Lá tremula bandeira branca com letras verdes na qual se lê, em latim: "Ad immortalitatem". Pessoalmente, sempre achei ridícula essa pretensão à imortalidade de nossos intelectuais. Considero esse querer não morrer uma declaração de mediocridade, pois só o medíocre precisa viver sob a ilusão de que será um dia o que jamais foi. A imortalidade, nas Letras, ainda não parece ter chegado às terras tupiniquins. Talvez somente Machado fique para a posteridade, e não Scliares ou Lêdos Ivos. Comparados a Dante, Homero e Goethe, esses sujeitos que hoje tomam o seu chá na Presidente Wilson estão como pulgas para um cachorro.
Levada ao mundo ludopédico, a imortalidade foi adotada como moto de um certo clube provinciano gaúcho, clube medíocre por natureza, portanto afeto à aspiração metafórica de ser algo maior do que é na efetiva realidade. Por mais que percam, por mais que não evoluam nas competições de que são partícipes, os torcedores, dirigentes e jogadores do citado clube insistem, para o enfado de quem goza de algum discernimento, na tese de berrar aos quatro ventos que jamais morrerão. Ora, ninguém jamais esteve pregando a morte desses senhores: o que se quer, como adversário ou apreciador de futebol, é que voltem ao mundo dos vivos, no bom sentido, e que abandonem a fantasia triste de serem atropelados, entra ano e sai ano, pelas circunstâncias e pela escassez de títulos e, não obstante, julgarem tais circunstâncias apenas um estorvo no caminho perene e garantido da imortalidade de que se julgam, digamos, exclusivos proprietários.
Ontem, por absoluta curiosidade, postei-me diante do televisor, a fim de assistir como se comportariam esses deuses imortais do futebol, com seus pijamas listrados, diante dos humanos áureo-cerúleos de Rosario. Vi, mais uma vez, o vexame de não ganhar simples jôgo em casa. Isso tudo, diante de uma quase que total ausência dos imortais torcedores, que, talvez, tenham subido aos céus para comemorar algum título etéreo, com troféus de matéria cósmica e faixas espirituais, escusando-se, então, de estarem presentes em ambiente tão mundano quanto o de um estádio.
Os imortais da Academia, ainda que medíocres, ficam, ao menos, na memória de quem lhes quer ou quis bem. Já os imortais do futebol, estes, apesar de medíocres, não conseguem jamais estabelecer-se na memória afetiva de ninguém, nem mesmo de quem os aprecia, pois sua imortalidade é blefe, algo que sempre renasce, mesmo quando estão bem mortinhos, escravizada pela baixeza que habita o coração e a mente de seus detentores.
Quinzeanossemtítulosmente,
Dom Ciffero
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